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ECT não pode tirar do trabalho remoto empregados que convivem com pessoas em grupo de risco para covid-19

O desembargador Grijalbo Fernandes Coutinho, do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10), negou liminar em mandado de segurança por meio do qual a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) buscava afastar decisão que a proibiu de suspender o trabalho remoto de empregados que coabitam com pessoas enquadradas no grupo de risco para a covid-19. Não se pode autorizar o trabalho presencial que pode vitimar de maneira fatal os familiares dos trabalhadores e expandir ainda mais a pandemia que abalou o mundo inteiro, destacou o desembargador em sua decisão.

Nos autos de uma Ação Civil Coletiva movida pela Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos contra a ECT, a juíza Elyzangela de Souza Castro Dickel, em exercício na 4ª Vara do Trabalho de Brasília, deferiu tutela de urgência para determinar que a empresa pública se abstenha de suspender o regime de trabalho remoto dos empregados que coabitam com pessoas inseridas no grupo de risco para o Covid-19, bem como os que possuam filhos em idade escolar ou inferior, e que necessitem da assistência de um dos pais, enquanto estiver em curso o estado de calamidade pública decorrente da pandemia.

Na insurgência contra essa decisão do primeiro grau de jurisdição, a empresa argumenta que adotou medidas de combate à pandemia, com definição de trabalho de remoto para pessoas no grupo de risco e empregados que convivem com pessoas nessa situação. Contudo, segundo a ECT, houve uma adesão ao trabalho remoto muito superior ao esperado, o que se somou a um aumento na demanda pelo serviço público postal no período, o que a levou a convidar para retorno ao trabalho presencial os empregados que não se enquadram no grupo de risco. A empresa diz que apenas tentou sensibilizar seus empregados para cumprirem suas jornadas de trabalho presencialmente, para que a população não seja ainda mais afetada.

Isolamento social

Em sua decisão, o desembargador lembra que é fato público e notório que o mundo vive um momento excepcional, decorrente do avanço de uma doença pouco conhecida (Covid-19), cujos efeitos irradiam-se em milhões de pessoas doentes e milhares de mortos. Conforme o desembargador, é consenso no seio da comunidade da área de saúde e do meio ambiente, notadamente entre pesquisadores nacionais e internacionais, cientistas de áreas diversas, virologistas, epidemiologistas e outros profissionais, que não há outra alternativa para combate à pandemia que não seja o isolamento social, como defende a Organização Mundial de Saúde (OMS), principalmente das pessoas enquadradas no grupo de risco.

Nesse contexto, frisa, é louvável a concretização de um Plano de Ação Geral por parte dos Correios, com o objetivo de implantar imediatamente o regime de trabalho remoto para os funcionários que se encontram no grupo de risco descrito pela OMS, bem como para os empregados que coabitam com pessoas qualificadas no mesmo grupo de risco, inclusive os que possuam filhos em idade escolar ou inferior, e que necessitem da assistência de um dos pais.

Todavia, ressalta, não é razoável o retrocesso e a convocação de trabalhadores que convivam com grupo de risco ou com filhos que necessitam de assistência dos pais, uma vez que não existem diretrizes científicas de que essa situação não ofereça mais riscos aos entes com quem eles coabitam. O princípio da livre iniciativa, principalmente na situação atual, não pode afastar os direitos fundamentais à saúde e à vida, revelando-se desproporcional a nova medida imposta pela impetrante, ressalta o desembargador, uma vez que não se pode autorizar o trabalho que pode vitimar de maneira fatal os familiares dos trabalhadores e expandir ainda mais a pandemia que abalou o mundo inteiro. “Não existe livre iniciativa sem direito à vida humana. A pandemia somente será controlada se houver medidas de isolamento social, como diz a ciência de maneira uniforme”,

Convite

Por fim, ao indeferir o pedido de liminar, o desembargador afirma que a alegação dos Correios de que fez um mero convite é incabível, “porquanto o empregador detém poder diretivo, sendo certo que, por corolário, o empregado submete-se, em subordinação jurídica, a todas as recomendações e determinações do patrão, sob pena de punição disciplinar”.

Confira, no link abaixo, a íntegra da decisão.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 10ª Região Distrito Federal e Tocantins, por Mauro Burlamaqui, 20.04.2020

TRT-10 mantém sentença que afastou justa causa para demissão de vendedor dependente químico

A Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) manteve, por unanimidade, sentença que afastou a justa causa para a demissão aplicada a um vendedor, dependente químico, que abandonou o veículo da empresa na rua. Lembrando que a dependência química é reconhecida como doença, o relator do caso, desembargador Ricardo Alencar Machado, explicou em seu voto que o trabalhador não se encontrava no pleno domínio de seus atos, sendo incapaz de reconhecer a gravidade de sua conduta, o que afasta o dolo na prática do ato.

Consta dos autos que, em um dia de outubro de 2018, o trabalhador saiu para o serviço externo de vendas no veículo da empresa e, após sofrer uma crise de abstinência por ser dependente químico, abandonou o veículo em via pública e não devolveu as mercadorias que estavam no veículo e nem prestou contas do valor das vendas, estimadas em R$1,7 mil. O veículo foi recuperado pela empresa, permanecendo o prejuízo relativo às vendas. Após o fato, a empresa demitiu o vendedor por justa causa.

Ao acionar a Justiça do Trabalho, o vendedor requereu a reversão da justa causa, com o pagamento devido das verbas rescisórias, alegando que não cometeu fato grave. O juiz da 22ª Vara do Trabalho de Brasília acolheu o pleito, fundamentando sua decisão no fato de o trabalhador ser dependente químico e no seu histórico na empresa como empregado zeloso e laborioso, segundo depoimentos.

No recurso ao TRT-10, a empresa a empresa defendeu a existência de justo motivo para a rescisão contratual. Sustentou que, mesmo sendo dependente químico, foi grave a conduta do trabalhador de abandonar, na rua, o veículo de entregas, sem devolver as mercadorias e os valores das vendas. Esse fato, segundo a empresa, gerou quebra da confiança para manutenção do vínculo de emprego.

Domínio das faculdades mentais

Em seu voto, o relator do caso salientou que a questão central no caso é saber se o trabalhador, por ser dependente químico, estava em pleno domínio das suas faculdades mentais quando praticou os atos descritos nos autos. Sobre este tema, o desembargador lembrou que a dependência química, reconhecida como doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS), é uma patologia geradora de compulsão, o que induz o dependente químico a consumir, de forma desenfreada, substância psicoativa que retira o discernimento sobre seus atos.

“Nessa compreensão, sobressai que o trabalhador, ao cometer as atitudes faltosas informadas pela empresa, não se encontrava com capacidade para discernir sobre a gravidade de seu comportamento”, frisou o relator, para quem o transtorno sofrido pelo empregado, diante da crise de abstinência pelo uso de entorpecentes, “deixa claro a sua consciência comprometida e a falta de dolo ao praticar os atos imputados a ele”. Aliás, segundo consta dos autos, logo em seguida ao acontecido, o trabalhador foi internado em clínica para tratamento de desintoxicação química e estabilização de comorbidades psiquiátricas, revelou o relator.

Além disso, o relator concordou com o argumento do juiz de primeiro grau quanto ao histórico profissional do vendedor, que durante os cinco anos de trabalho para a empresa sempre teve conduta correta, tanto que chegou a ser convidado pela empresa a exercer cargo de supervisor, segundo depoimentos contidos nos autos.

O desembargador Ricardo Machado concluiu seu voto no sentido de afastar a justa causa para a demissão, confirmando a sentença do juiz da 22ª Vara do Trabalho de Brasília.

(0000161-76.2019.5.10.0022)

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 10ª Região Distrito Federal e Tocantins, por Mauro Burlamaqui, 15.05.2020