A Federação Única dos Petroleiros (FUP) já pediu na Justiça a alteração da jornada de trabalho nos Estados do Amazonas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Espírito Santo
RIO – A contaminação acelerada da Covid-19 entre funcionários de plataformas e refinarias da Petrobrás é o foco de dezenas de ações judiciais impetradas pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), que representa a maioria dos empregados da estatal. Especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast afirmam que, no futuro, a empresa pode ter as finanças afetadas por essas ações.
Mais de 800 petroleiros próprios da empresa e terceirizados já foram contaminados, segundo o Ministério de Minas e Energia, que no seu cálculo utilizou informação repassada pela empresa. Há ainda 1.642 casos sendo investigados.
A companhia petrolífera, por meio de sua assessoria de imprensa, informa que até o dia 2 de maio, 330 empregados (em um total de 46.416) tiveram teste positivo para Covid-19, sendo que 143 já se encontram recuperados. Todos os empregados com suspeita passam por teste. Ela não contabiliza a contaminação de terceirizados, que são maioria nas plataformas. A empresa também não divulga possíveis mortes. Mas a FUP diz ter conhecimento de pelo menos seis óbitos.
Na Justiça, o sindicato questiona, principalmente, a distribuição pela empresa de máscaras eficientes e a realização de testes para examinar possíveis contaminações dos empregados de todas as unidades operacionais. Os processos não vão chegar a ser julgados neste ano, por conta da quarentena no judiciário. Ainda assim, a FUP vai recorrer às liminares para tentar forçar a companhia a atender suas reivindicações.
Até agora, a federação entrou com pedido de liminar contra alterações da jornada de trabalho na Justiça do Amazonas, Duque de Caxias (RJ), Rio Grande do Sul, Paraná e Espírito Santo.
“A Petrobrás vem aproveitando a emergência da pandemia para reduzir o custo da mão de obra. Promove modificações para pior em termos de Jornada de Trabalho, remuneração, e segurança, saúde e meio ambiente”, diz Jorge Normando Rodrigues, assessor jurídico da FUP.
Para o sócio do Terciotti Andrade Gomes Donato Advogados, Marcelo Marinho, a infecção por Covid-19, se for configurada como doença ocupacional, pode gerar o direito à estabilidade no emprego por 12 meses após o retorno, “o que certamente teria impacto no caixa da empresa, ainda mais se pensarmos na grande quantidade de pessoas que podem se contaminar”, afirmou Marinho.
Já Rodrigo Moreira, sócio do Vieira Rezende, afirmou que a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que tornou sem efeito artigo da Medida Provisória 927/2020, que dizia que a Covid-19 não seria considerada doença ocupacional faz com que as empresas possam ser responsabilizadas caso o empregado seja contaminado no ambiente de trabalho, ou até mesmo no trajeto entre o trabalho e a residência. “Isso certamente terá grande impacto nas relações de trabalho e no passivo trabalhista das empresas”, avaliou.
“Junto do Ministério Público do Trabalho (MPT), os sindicatos podem promover uma ação civil pública. Ao definir possíveis multas, a Justiça considera o tamanho do dano, o número de pessoas atingidas e o potencial econômico da empresa. Para uma empresa como a Petrobrás, costuma ser alta. Já vi casos semelhantes com multas de até 30% do faturamento anual e efeitos no caixa”, avalia Leonardo Carvalho, sócio das áreas trabalhista e previdenciária do BVA Advogados.
MPT acompanha avanço do vírus na empresa
A coordenadora nacional do Trabalho Portuário e Aquaviário do MPT, Flávia Bauler, acompanha diariamente o avanço da Covid-19 na Petrobrás. Segundo ela, a estatal está fazendo um monitoramento domiciliar da doença entre os seus empregados e testes rápidos nos embarques para as suas plataformas. Mas nem todas as medidas envolvem terceirizados, que nas plataformas são maioria.
“A gente tem algumas investigações em andamento em relação às empresas afretadas (empresas contratadas pela Petrobrás para operarem as plataformas) para que elas apliquem os mesmos procedimentos adotados pela estatal. Se a gente não conseguir, numa eventual ação judicial, a estatal também tem que ser responsabilizada, porque ela é a concessionária (do campo)”, acrescenta.
Outro prejuízo possível de acontecer à empresa, segundo a FUP, é que, com o crescimento da doença, e com menos gente disponível para a operação, a produção das plataformas seja afetada.
A Petrobrás, por meio de sua assessoria de imprensa, diz que testa os terceirizados no embarque. Afirma também que tem tomado uma série de medidas preventivas desde o início da pandemia. Além das mudanças na rotina de trabalho para ampliar o distanciamento entre os funcionários, tem realizado testes nos que apresentam suspeita de contaminação e, nas plataformas marítimas, adota medidas preventivas antes do embarque, como o monitoramento médico e a realização de testes rápidos. Suspeitos e contaminados são isolados, segundo a companhia, que iniciou também o monitoramento domiciliar.
Fonte: Estadão, por Fernanda Nunes e Denise Luna, 07.05.2020